O médico Márcio Antônio Souza Júnior foi condenado a pagar uma indenização de R$ 300 mil por racismo após gravar o caseiro da fazenda dele em Goiás (GO) acorrentado e publicar o vídeo nas redes sociais afirmando que ele estava em uma “senzala”. A sentença do Tribunal de Justiça de Goiás foi divulgado no domingo, 26.
Entenda o caso:
- No dia 15 de fevereiro de 2022, o médico gravou Ernando Correa da Silva acorrentado por equipamentos que se assemelham aos utilizados durante o período da escravidão;
- “Falei para ele estudar, mas não quer… E vai ficar na minha senzala”, disse Márcio Antônio Souza Júnior em um vídeo divulgado no Instagram;
- Após a repercussão negativa, o médico publicou outro vídeo afirmando que tudo não passava de uma brincadeira, e que ele e o funcionário eram amigos;
- “E aí, camarão. O povo está enchendo o saco. O que você fala disso?”, o que é respondido pelo caseiro com “tem nada de escravidão não gente”;
- Após o ocorrido, a Polícia Civil recebeu várias denúncias e passou a investigar o caso.
Posteriormente, o Ministério Público abriu um processo contra o médico, que foi concluído neste domingo, 26, com a condenação do acusado. “Verifico não haver dúvidas de que o acusado, de forma livre e consciente, praticou discriminação e preconceito de raça e cor, por meio de publicação de vídeo em sua rede social”, afirma a juíza Erika Barbosa Gomes Cavalcante no documento.
O funcionário Ernando Correa da Silva, afirmou quando questionado que trabalhava na fazenda do acusado, conhecida como Jatobá, e que recebia um salário mínimo para realizar trabalhos pesados. No dia em que o crime ocorreu, o caseiro teria sido chamado pelo médico até a “igrejinha” da propriedade, onde foi acorrentado contra a própria vontade, mas aceitou devido ao cargo de importância do condenado.
Ernando também relatou que Márcio Antônio Souza Júnior teria recebido uma ligação apenas dois minutos depois do vídeo ser postado, pedindo para que o conteúdo fosse retirado. O médico disse que não seria possível e teve a ideia de gravar uma segunda filmagem, ordenando o caseiro a falar as palavras que o sentenciado desejava. O funcionário conclui que não viu a situação como uma brincadeira, não gostaria de estar envolvido e que ele e o condenado não eram amigos.
O pai do médico, Márcio Antônio Souza, declarou ao juizado que os apetrechos utilizados nas gravações foram encomendados por ele, mas não sabe como teriam ido parar na casa do sentenciado. Márcio Antônio Souza Júnior negou a acusação e disse que jamais teve a intenção de praticar racismo, mas admite que pegou os equipamentos do pai e “os usou de forma errada” para fazer uma “brincadeira indevida”.
Erika Barbosa Gomes Cavalcante, afirma no processo que a versão do médico não é compatível com a de nenhuma outra testemunha e que o conteúdo publicado por ele é expressivo, já que o acusado pertence a uma família tradicional de Goiás e acorrentou um funcionário negro de pouca instrução, praticando a discriminação.
“Ressalto ainda que, a defesa do acusado sustentar que a postagem foi direcionada apenas às pessoas pertencentes aos contatos dele em sua rede social do Instagram, é discrepante, já que o vídeo abarcou toda uma coletividade com contundente repercussão negativa, inclusive, com reconhecimento nacional sobre o caso”, escreveu a magistrada, afirmando que a filmagem afeta a dignidade das pessoas negras.
O médico foi condenado a pagar uma indenização de R$ 300 mil, sendo este valor repartido e enviado a associações que contribuem com a consciência negra. Uma pena de dois anos e seis meses de reclusão também foi emitida, além dos objetos utilizados pelo acusado no conteúdo postado por ele serem recolhidos. O médico ainda pode recorrer da sentença. IstoÉ