O fim de tarde parecia uma prece…. Patrícia Lopes de Oliveira escreve….

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Crônica
O fim de tarde parecia uma prece, que meu coração, ainda, carece de ouvir algumas vezes.


Tem um lugar no meu coração que se chama esplanada. E por diversos motivos, dos lugares que morei nessa cidade. E não foram poucos. Um foi palco de muitas memórias. Um lugar privilegiado! Muito próximo da estação de trem. Era uma esplanada. Um terreno plano, largo e extenso. Define o dicionário.

O que nunca definirá é o sentimento que acompanha aquela paisagem em minha vida. O extraordinário que ficou em minha alma.

Parece exagero?
Permitam-me utilizar o excesso das palavras e das emoções, para falar do que vivi ali, naquele lugar, naquele tempo.

Os trens iam e vinham. As pessoas se encontravam e se despediam. Quantos abraços, sorrisos e lágrimas eu pude presenciar naquela estação. Cenário de infindáveis emoções que se tornariam eternas em minha mente.

Ainda posso ver aquelas toras imensas de madeiras espalhadas pelo chão. Como era imenso aquele lugar. Nas minhas memórias, um mundo à parte. Onde corríamos e andávamos livres pelos trilhos da velha ferrovia, com os braços abertos a equilibrar nossos sonhos. Pura poesia! Tínhamos a certeza do quanto era nosso aquele pedaço de chão. Não tínhamos medo de nada. Uma vida toda a conquistar.

Quantas vezes atravessamos pra cá e pra lá com o trem em movimento. Que infância admirável. O sol estava nascendo quando já estávamos a esmiuçar cada pedacinho daquele mundo tão particular.

Buscávamos e vivíamos grandes feitos, aventuras. Tínhamos coragem e ousadia. O perigoso não nos assustava. Conhecíamos cada palmo daquele lugar. Sabíamos de cada detalhe. O horário dos trens de passageiros e o horário daqueles que transportavam cargas. Tínhamos conhecimento que o imprevisível dependia do destino, da sorte, do acaso. No fim da tarde, com o sol se pondo, o céu tinha uma cor diferente. Era um alaranjado tão forte. O fim de tarde parecia uma prece, que meu coração, ainda, carece de ouvir algumas vezes.

Era ali, também naquele espaço, que os circos que chegavam na cidade, se instalavam. Era uma festa! As lonas coloridas. Pessoas diferentes! Pareciam tão alegres. Montavam tudo tão rapidamente. Ali na frente de casa. Guardei tantos nomes. Me lembro de uma menina pequena que dançava o tempo todo. Chamava-se Ana Maria! E seus pais eram Helena e Antônio. Foram tantos circos, tantos palhaços. Tantos trapezistas que ainda voam alto em minhas lembranças mais fantásticas.

Fomos crianças felizes a correr por aquela esplanada.

Se existe um céu na terra, o meu, certamente, foi ali. Me lembro do pátio ao lado do Mercado. Das noites em que eu e meus irmãos brincávamos naquele lugar. O mercado era onde feirantes tinham boxes, onde vendiam todo tipo de frutas, verduras e legumes. Me lembro de todos! Famílias inteiras trabalhavam ali. Eram amigos! Ainda moram em meu coração. A vida passa ligeira. O tempo passa por nós. Mas, não leva tudo!
Deixa muitas saudades!

Ainda, quando passo por ali, o meu olhar insiste em ver tudo de novo. Lembranças espalhadas! Volto no tempo como a folhear páginas de livros. Retorno! Quanto tem de cada um de nós ali. Às vezes, parece que posso ouvir as gargalhadas das crianças. Parece que posso sentir o vento a tocar meu rosto. O coração disparado…

Quantas histórias tem a nossa esplanada. Um presente de Deus ter crescido com tanta liberdade e tão perto da felicidade.

Não éramos prisioneiros da tecnologia. Nem tenho a pretensão de explicar a privação da beleza sutil da vida, da beleza da simplicidade que isso causa.

Ah se pudéssemos ignorar o tempo…

Vejo a vida, como aquela estação.
Um trem que passa em nossas vidas. Uns embarcam mais cedo e outros mais tarde. Muitos já se foram. De alguns nos despedimos. E de outros não. Um dia estaremos nessa estação para o embarque final. Quero imaginar que o até breve será dali. Com os olhos pregados nesse horizonte tão esplendoroso. Daquele canto tão amado, tão nosso, tão encantado.


PATRÍCIA LOPES DE OLIVEIRA
É escritora


19:08:11

Respostas de 2

  1. Obrigado pelo texto esplendoroso que retrata a sua e aminha infância, pois foi nesses arredores que cresci e contemplei as mesmas cenas.

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